Lá fora existe o mundo, pessoas, famílias,
crenças e descrenças na mais bela antítese da vida. Existe o todo absoluto e na
mesma proporção o reverso de todos os conceitos.
O ar que respiro invade meus pulmões e me
acalma, sei que tudo isso não é pra mim. Meu corpo não é capacitado para
tamanha informação e tempo. Sairei de palco sem ter experimentado diversos
pratos que me agradariam muitíssimo, pessoas nas quais seria amigo íntimo,
centenas de possibilidades de amores para o resto da vida, e outras tantas de
fracasso e briga.
Vi um avião passar entre as nuvens e pensei
nos sonhos, suspiro deitado na cama. Quantas horas passei nesse mundo? Agarro o
lençol azul de bolinhas brancas e fecho os olhos e abro a imaginação. Andar por
jardins abstratos ou realizar delírios inconseqüentes? Nele, poderia guardar
segredos do mundo gritando-os aos quatro ventos. O sonho é o nosso combustível,
criamos a máquinas, voamos como os pássaros, descobrimos novos planetas. Depois
disso, choramos. Criamos as soluções e as armas, a paz e a guerra.
- Não leve flores para um dia de guerra e nem
armas para um dia de paz- disse uma vez a uma amiga.
Inventamos diversas normas e regras, giramos
engrenagens e fortalecemos culturas. Fomos nossos próprios deuses, condenando
inocentes e perdoando culpados, falhamos na tarefa máxima da justiça.
Quantos risos se perderam na desigualdade? Mães
que lutam para sustentar os filhos, isso devia soar como heroísmo, e não
superpoderes, assassinos e lutas entre o bem e o mal.
Escolhemos investir na educação,
estabilidade, casamentos e filhos. A linha natural da vida. Como seria tracejar
essa linha de outras maneiras numa folha em branco? Não seria bom ser um idoso
sem reclamar da vida? Um adolescente sem confusões e problemas? Talvez fosse
bom tirar as próprias conclusões. Ainda mais pensando que todos nós teremos um último
dia para tudo. E quando esses dias chegarem, o tempo vira pó e não há como
voltar atrás.
O que somos? O que seremos?
Nossos líderes estão preparados para nos
guiar? Ou somos dezenas de países caminhando para lados diferentes e
consequentemente obtendo resultados distintos?
Abro os olhos, chega de filosofia. Estou
pronto.
Tenho uma colina de perguntas para fazer, não
sei para onde ir, acho que amo e odeio com tamanha intensidade. Consigo chorar
e rir, mas acima de tudo. Consigo errar.
Vejo o espelho como quem vê estilhaços. Um
caco de vidro simboliza cada aprendizado, cada pessoa que me colocou medo ou
confiança, que fez quem eu sou.
- Não ouça os seus pensamentos. Às vezes
eles perturbam, tiram o sono.
A cada momento escuto frases.
- Quer casar comigo?
- Estou grávida.
- Fulano morreu.
O corpo cai. Chega à tristeza, a angústia. Penso
que estou soterrado, esquecido, sozinho.
Danço com a bela dama como se estivesse
dançando comigo mesmo. Rodeado de cortinas da corte, fantasmas.
- Preciso de você- e a beijo.
Tiro sua máscara e não vejo ninguém.
O salão está vazio.
O vestido de noiva manchado de vermelho,
manchado de sangue!
De
repente, vejo um objeto entre as suas vestes brilhar. Dourado, agarro o troféu
feito de ouro, e ergo acima da cabeça como os falsos campeões.
Isso mesmo, nem todos estão dispostos a
apreciar uma bela dama. Mas sim, o que isso significa.
Eu sei. É preciso se firmar com os outros. Não
se preocupe, eles não merecem tanta importância assim, são tão fracos, humanos
e cheios de vício quanto você.
Por
fim, chego ao portão de casa. É o último dia que sairei por ele. Depois de
tantas entradas e saídas, me despeço de casa como quem se despede de varrer o
chão. Tão simples e sem significância que nem ao menos reparei.
- Sentirei saudades?
- Imensa saudade.
Um dia acordei, escovei os dentes, me
arrumei e fui trabalhar. Depois voltei pra casa e troquei de roupa para ir à
universidade. Após a última aula, voltei para casa de metrô e dormi. Foi
perfeito. No meio de tudo isso, vislumbrei belos prédios em São Paulo durante o
percurso, conversei com pessoas maravilhosas, aprendi muito. Ri algumas vezes e
pensei em zilhares de besteiras. Fiquei no ponto de ônibus, esperando o tempo
passar!