25 de abr. de 2015

Incertezas

    Existe a vida perfeita? O casal perfeito? O sonho perfeito?
    Caroline e Corey observavam as estrelas de mãos entrelaçadas. Diante deles, um lindo céu azulado escuro costurado por pontos brancos, brilhantes, refletia os doces encantamentos originados por poetas tristes e esperançosos do tempo em que a tecnologia não ofuscava o romantismo.
    Seria o primeiro beijo ou o último? Mexer com os sentimentos dos outros e de si próprio requer muita coragem! Se eu pudesse definir em palavras, diria que se parece com algo meramente abstrato. Hoje poderia ser um dia apropriado para iniciarmos a nossa união até completarmos bodas de ouros, já amanhã, vejo que não.
    Não há segunda chance. Assim como não somos os mesmos. Somos múltiplos, e por mais incrível que pareça, cada dia podemos ser alguém e somos nós mesmos.
   O casal caminhou até a beira da lagoa que ficava no centro do imenso jardim.
    - O que podemos dizer de nós dois? – perguntou Corey diante de seus reflexos na água.
    - Digamos que somos pessoas de sorte. – respondeu Caroline com um sorriso no rosto- Sabe, ás vezes fico pensando. Não é como se fossemos pessoas normais. Pensamos tanto no nosso modo de agir, de viver que chega até ser estranho. Podíamos ter três filhos, uma bela casa. Eu cuidando dos afazeres domésticos e você trabalhando arduamente para concretizar toda essa situação. Mas, queremos ser mais do que isso. Queremos ser os personagens incríveis dos livros, os casais idealizados do cinema, queremos ser diferentes e felizes – seus olhos brilhavam mais que a lua cheia. Ela apertou a mão de Corey mais forte- Queremos ser imortais?
    Corey lentamente sentou no gramado do jardim, esticou sua mão até a lagoa e tocou levemente na água. Sentiu-a fria entre os dedos. Tentava segurá-la, contudo ela escapava. Ele continuou brincando com a água, antes de dizer:
    - Todos nós vivemos como se fossemos imortais. Fazemos planos continuamente! Ano que vem gostaria de fazer um intercâmbio, mês que vem devo voltar à universidade, sábado devo levar minha mãe ao médico, amanhã cortarei o cabelo. Quantas vezes você não ouviu isso? E se não tivéssemos esse tempo? Estaríamos planejando sem necessidade? Se soubéssemos o tempo que nos resta, será que não teríamos outras prioridades? É como se tentássemos controlar o futuro, e por uma incrível coincidência, conseguimos na maioria das vezes, até que ele nos varre ao tempo, como uma folha que caí da árvore durante o outono. Pronta para se apagar da paisagem até chegar ao chão, a certeza absoluta dos fatos.
   Caroline abaixou-se e tocou no ombro de Corey, que se virou até seus olhares ficarem um de frente do outro.
   - Deixa eu te contar um negócio- sussurrou ela, aproximando-se do seu ouvido.
   De repente, com uma força desproporcional, ela empurrou fortemente Corey na lagoa, que desprevenido caiu como um pato.
   - Eu manipulei todo o seu futuro em doze segundos- Caroline sorriu enquanto Corey voltava á superfície.
   - Isso não vai ficar assim.
   - Não! – suplicou ela.
   Tarde demais, Corey já havia colocado as mãos molhadas no seu vestido amarelo com bolinhas brancas, colocou-a no colo e pulou na lagoa.
   A água gelada enrijeceu toda a sua pele. Uma sensação de liberdade, aventura afugentou seus corações. Nadavam até a profundidade como se estivessem voando no céu.     
   Corey tentava segurá-la, mas Caroline nadava mais rápido... Segundos de distância o separavam.  O ar estava prestes a acabar quando Caroline olhou uma última vez para ver onde Corey estava. E o que viu foi um garoto interessante e misterioso, com cabelos negros e olhos escuros fazendo com as duas mãos o formato de um coração antes de voltar à superfície.
   Ela também voltou.
   Uma nuvem encobria uma parte da lua, escurecendo ainda mais o céu.
   Eles se olharam num átimo de segundo e um nadou o mais rápido possível de encontro ao outro.
   Logo seus lábios se chocaram e se aqueceram antes das juras de amor.
   - Quero ser essa pessoa que você acha que eu sou- sussurrou Corey em seu ouvido.
   - Então, não mude nada.
   - Minha beleza será roubada com o tempo.
   - Assim como a minha. Mas isso não é o mais importante. O mais importante é que a sua cabeça não mude. Quero que você continue sofrendo com os seus pensamentos, com as questões que rodeiam o mundo. Que você erre compulsivamente, assim como acerte. Merecemos o imprevisível, a certeza de que podemos dar ou não certo. De que podemos fazer bodas de ouro ou não. A certeza de que nos reinventaremos sempre que for preciso, surpreendendo assim as nossas incertezas.
   - Depois dessas palavras, eu certamente a beijaria- disse ele, mas em vez de fazer isso, ele mordeu-lhe o pescoço até fazê-la sangrar.
   Não demorou muito e ela morreu em seus braços. E assim como a água, escapou dos seus dedos até encontrar o fundo da lagoa e repousar em berço esplêndido.

    FIM

Um comentário:

Mariana Santos disse...

Ficou incrível! E esse final não poderia ser outro... Adorei!

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