17 de jun. de 2015

Martelando os Dedos

Nesses dias, no qual dormir na coberta alheio de pensamentos parece o melhor remédio para combater a insônia, eis que surge um pássaro em minha janela.
Primeiro, com permanente preguiça, penso se tratar de um sonho. Devo estar em Twin Peaks a exatos 700 zilhões de quilômetros luz da Terra, em busca do assassino de Laura Palmer, que eu aposto que ninguém em sã consciência solucionaria esse mistério, quando escuto um barulho nas grades da minha janela.
Com o gosto amargo do despertar sobre os lábios, continuo com os olhos fechados. Tenho a esperança de que seja algo banal, e que logo vai passar. Assim como os meteoros, onde poucos parecem notar.
Mas como tantas outras coisas na vida, acabei por me enganar. O pássaro continuava fazendo um barulho estranho. Tive a nítida impressão de que queria falar.
Derrotado, abri os olhos. Nem cheguei a comemorar a marca de sete mil novecentos e oitenta e nove dias de vida. Parecia algo irrelevante, até que eu desse conta de que do tempo ninguém sai incólume.
Quando cheguei ao batente da janela, vejo o corvo colocar os olhos sobre mim e dizer algo baixinho, no qual, eu tenho certeza absoluta se tratar de palavras da língua portuguesa.
Fico com medo de me aproximar para ouvir sobre o que ele fala. Porém, a curiosidade fala mais alto. Me aproximo, seus olhos se arregalam. Sinto uma afronta, um combate. Vejo medo nos seus olhos também. Sou rápido! Agarro seu pescoço e começo a apertá-lo,  o corpo rígido e cheio de penas começa a chacoalhar, lutando pela vida. Os movimentos rápidos e constantes sugerem que algo está próximo de entrar em ebulição. Algumas penas se desprender e caem lentamente no chão. Assim como a vida do corvo, que a cada segundo parece desaparecer.
Tic-tac, o tempo passa. Os movimentos ficam mais lentos. A luta parece chegar ao fim.
Com lágrimas nos olhos, eu fraquejo os punhos, largo o corvo, que ainda parece estar vivo, contudo sem forças para reagir. Sento no chão, lágrimas escorrem do meu rosto. Eu o odeio por isso! Eu sinto pena dessa marionete com bico de pássaro e penas tão negras e fétidas quanto as de um Urubu.
Deliro, estou num sonho tão louco e abstrato que nem consigo pensar onde estou. Apesar de que, nesse sonho/pesadelo posso estar num país na qual não existe corrupção generalizada, tão pouco idealistas e radicais.
Volto à realidade e olho o relógio. Não tenho tempo para... Sonhar!
O tic-tac ensurdecedor não para nem um segundo. Por alguns instantes fico hipnotizado, até ouvir o corvo gritar:
- Egoísta! Egoísta! Egoísta!!
Olho para a janela e não vejo ninguém. Olho para as minhas mãos e vejo penas, e sangue escorrendo entre os meus dedos. O corpo do corvo imóvel no chão.

A voz da morte sussurra em meus ouvidos e me convida para dormir!

FIM

Imagem: Cena de Twin Peaks.